quinta-feira, 8 de outubro de 2009
JECA TATU/LOURDES
Quando criança, meus pais diziam que eu era quase autista, tão silenciosa. Lógico que eles não usaram esse termo, pois nem sabem o que é isso. Mas diziam que até parecia que não tinha nenê em casa.
À medida que fui crescendo, era uma criança sem vida e anêmica, magricela. E minha mãe socava vermífugo em mim, o tal Licor de Cacau, conhece? Pois é... Ela dizia que eu tinha o verme do Jeca Tatu. Ela me contava que Jeca Tatu era preguiçoso, portanto não gostava de trabalhar, tudo para ele era difícil, era desanimado. Até contava uma estórinha assim: “Dizem que Jeca Tatu, ficava deitado à beira de uma árvore, tomando a fresca, e nada de querer trabalhar na roça. Daí alguém perguntou a ele: Jeca? Porque você não planta? Ele respondeu: Plantar? Eu? Pra que? Não paga a pena a formiga come tudo.
Mas como é que o seu vizinho italiano não tem formiga no sítio?
É que ele mata.
E porque você não faz o mesmo?
Jeca coçava a cabeça, cuspia por entre os dentes e vinha sempre com a mesma história:
Quá! Não paga a pena...
E sempre o Jeca arrumava uma desculpa pra não trabalhar.E minha mãe falava assim:" Coitada da minha fia deve ter o verme do Jeca Tatu."
Minha mãe corria comigo em vários médicos e nunca descobriu que eu tinha um problema na afetividade. Fui descobrir isso há uns quatorze anos atrás.
Mas apesar de todas as dificuldades, estamos sobrevivendo.
Abraço. Lourdes.
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